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NDP Fest entrega política, caos e intensidade apesar das adversidades

Wiki Metal 19 horas atrás


Texto por Stephanie Souza

No último domingo (9), o clima era de ansiedade ao redor do Espaço Usine, no bairro da Barra Funda, em São Paulo. Esse foi o local que a New Direction Productions escolheu para celebrar seu primeiro ano de vida no novíssimo NDP Fest, festival que contou com a participação de sete bandas dos gêneros metal e hardcore. 

O rolê começou bem cedo, às 15h, e alguns ansiosos já estavam na fila aguardando a abertura da casa, que foi pontual. Logo na entrada, barraquinhas de merch ocupavam o espaço anterior à pista, e muitos que entravam paravam pra olhar e comprar algum item das bandas do line. É preciso apoiar a cena, não é? 

Às 15h20, a banda fluminense de punk rock Klitoria subiu ao palco, abrindo os trabalhos do que seria um longo dia de música ao vivo. O grupo é novo, formado em 2022, majoritariamente constituído de mulheres, e já vem conquistando espaço na cena — foram o ato de abertura para o show solo do Amyl and the Sniffers, na última quinta-feira (6). O set foi curto, de apenas meia hora, mas conciso, rápido e agressivo. Malu Desu apresenta vocais rasgados enquanto mostra coordenação excepcional na bateria, em conjunto com Brayner, guitarrista, que dominou o lado esquerdo do palco com sua energia. A setlist apresentou músicas de seu novo EP, intitulado Entre o Chão e o Assoalho. Mesmo com alguns problemas técnicos, a apresentação foi enérgica e ditou um ótimo tom ao que se seguiria no resto da noite. 

A segunda banda da noite veio logo após: os paulistas do Hardgainer se definem como uma banda de “metal pesado”. Com duas mulheres em sua composição, Ellen Tavares na bateria e Patrícia Schlithler no baixo, a banda abusou de riffs, de fato, pesados e muitos berros do vocalista Patrick Marçal. Um show bastante técnico, demorou um pouco para aquecer os presentes, que só foram engajar em uma roda bem próxima ao fim do set. A banda pareceu se divertir bastante no palco e compartilharam que aquele era “o maior show de sua carreira”. 

Logo depois foi a vez dos cariocas da Clava, que entregaram uma apresentação caótica, intensa e bastante politizada. Afinal, hardcore é político. Em uma bandeira — instalada pela banda — na frente do palco se lia: “Terra para quem nela vive e trabalha. Viva a revolução agrária. Morte ao latifundiário!”. É política mas também é diversão: a abertura do show usou um sample de God of War, e no telão, um jogo das Tartarugas Ninjas foi exibido. No palco, os integrantes pulavam e se entregavam em cada nota. No público, os presentes se dividiam entre two steps, crowd surfing e socos e chutes jogados ao ar. A setlist passou por músicas de seus três trabalhos: Correr pelo Céu, de 2024, Sudaméfrica, de 2022 e Declaração de Guerra dos Condenados da Terra, de 2021. Também rolou um cover de “Santuário das Almas” da clássica banda de hardcore Confronto, conterrâneos da Clava e grande influência para o grupo. Um dos shows mais potentes da noite, a banda é direta em sua mensagem, reforçada pelo vocalista Alex, que, em discurso reafirma: mesmo que queimem os símbolos, jamais queimarão os significados.

Os mineiros do Black Pantera também marcaram presença no festival. Banda em ascensão na cena do metal, abriu shows para gigantes como o Slipknot e o Sepultura no ano de 2024. O grupo tem a habilidade de fazer um show em casa pequena parecer um show de arena. Muito groove e slapping no baixo – Chaene da Gama possui presença de rockstar inata –, momentos de explosão intercalados com momentos de reflexão, uma roda só de mulheres, um wall of death, coro em “Fogo nos Racistas”, vocais incansáveis de Charles Gama e energia de sobra na bateria comandada por Rodrigo Pancho. Uma atração completa e com uma mensagem importante e atual: a luta antirracista. 

Já era noite quando chegou a vez do Point of no Return. Clássico do hardcore straight edge paulista, foi também uma das atrações mais aguardadas do line: 18 anos depois de seu fim, em 2006, a banda voltou à cena em 2024 após o lançamento de seu novo álbum The Language of Refusal. Logo nos primeiros segundos de show, o centro da casa se transformou numa enorme pista de dança. Ou melhor, numa enorme demonstração de energia e força. Corpos suados disputavam espaço entre two-steps, crowd surfing, socos e empurrões, enquanto os três vocalistas – Fred, Kalota e Ruy –  conduziam a energia caótica do público, que também brigava pelo microfone.

A descarga de energia foi tanta que o show teve que ser parado após uma pessoa se machucar e ter que ser retirada (nada grave aconteceu). É importante mencionar que o Point of no Return não é apenas uma banda, mas também um ato político, perceptível em todas as letras e discursos de seus membros. Durante as músicas, um dos vocalistas disse: “é uma luta não por um sistema ideal, uma sociedade perfeita (…) mas por algo que esteja em constante processo de evolução”. Fechando com chave de ouro, a última música apresentada foi um cover de Unbroken Feelings, da banda Self Conviction (formada e também encerrada nos anos 90 por membros do PONR). 

O momento mais polêmico e desconfortável da noite ficou por conta da primeira atração internacional do rolê: ZULU, banda de hardcore de Los Angeles, fez seu primeiro (e provavelmente último) show no país. No dia anterior à apresentação, uma ex-namorada do vocalista Anaiah Rasheed acusou o cantor de agressão e comportamento abusivo em post no Instagram. Mais tarde no mesmo dia, Anaiah negou as acusações. Os demais integrantes não se manifestaram sobre o caso. Por conta disso, essa era uma das maiores incertezas em relação ao show do grupo no evento, já que a notícia se espalhou, causando desconforto em diversos presentes.

O vocalista chegou a ir à casa de shows, mas foi embora antes de sua apresentação. O restante da banda foi obrigado a seguir com o combinado com Dez Yusuf, guitarrista, assumindo os vocais. Enquanto o show acontecia no palco, um burburinho se formava no público ao passo que uma briga se desenrolava e parte da equipe de produção tentava apartar e acalmar os ânimos. No palco, a banda parou o show algumas vezes mas, sem entender o que ocorria, optaram por continuar a tocar apesar do que acontecia. As 13 músicas da setlist parecem ter passado num segundo, já que o desconforto se seguia não apenas no palco mas também fora dele. ZULU era uma das bandas mais esperadas do line e, devido às acusações, a NDP Productions optou por não seguir com as apresentações restantes do grupo. É importante reforçar que as bandas presentes não compactuam com o comportamento do vocalista do ZULU. 

Após o caótico show do ZULU, foi a vez da última atração da noite, Earth Crisis. Os nova-iorquinos retornaram ao Brasil após 16 anos e foram o momento de maior delírio do festival. Karl Buechner, vocalista, entregou o microfone para diversas pessoas que se amontoavam ao pé do palco, enquanto uma enorme roda colocava a casa toda em seu estado mais caótico do dia. “Gomorrah’s Season End” fez os mais fãs subirem ao palco para gritar o momento mais explosivo da canção “I am straight edge”. O discurso vegano e straight edge era reforçado pela força do público, que não poupou energia por um segundo da apresentação. Na última música, “Counter”, cover de The Path of Resistance, parte da casa invadiu o palco, encerrando a noite com chave de ouro em um caldeirão de euforia e selvageria.

É seguro dizer que o primeiro NDP Fest será um para se lembrar, no estilo “quem viveu, viveu”. Mesmo com o golpe recebido no dia anterior ao evento, alguns pequenos problemas técnicos comuns em qualquer evento, a produtora entregou um trabalho competente e celebrou seu primeiro ano de vida em grande estilo. De lanche vegano a barracas de merch a discursos políticos e retorno de bandas lendárias, o hardcore venceu na noite do dia 9.

Confira as fotos do nosso colaborador Thiago Vidal:





Via: WikiMetal

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