O punk rock não está morto, brada Wattie Buchan, do The Exploited, em suas redes sociais. E para não ficar só nas bravatas virtuais, o punker, mesmo no alto de seus 67 anos, vem provando que o gênero, bem como o seu espírito inquietante, não está residindo a sete palmos do chão, com meia dúzia de fãs arrastando correntes em shows mequetrefes.
Ao contrário disso, o punk rock ainda está lotando as casas de espetáculo, como aconteceu neste último sábado, 10, no Circo Voador, Rio de Janeiro, onde reuniu centenas de fãs para exorcizar os seus demônios ao som de The Chisel, Ratos de Porão e The Exploited.
The Chisel é um quinteto vindo das terras frias de Londres, o qual possui dois álbuns completos e quatro EPs no currículo, apesar de ter começado a carreira em 2020. A vitalidade dos principais nomes do punk é parte essencial do DNA musical dos britânicos, o que ficou bem claro ao público brasileiro.
Sons como No Gimmicks, Evil by Evil, Retaliation, Fuck Em’ e Chisel Boys trataram de dar uma boa impressão do que se trata o teor sonoro do grupo, além disso, provaram que o estilo está em boas mãos quando se fala das novas gerações do punk rock.
Rápida troca de equipamento, os cariocas, que ansiavam pela terapia sonora proporcionada pelo Ratos de Porão, tiveram o que queriam em alto e bom som. João Gordo (vocal), Jão (guitarra), Boka (bateria) e Juninho (baixo) fizeram o que se esperava, isto é, um show pesado e com o dedo atolado nas feridas sociais.
Bandeiras do MST (Movimento Dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) e do escritor e guerrilheiro comunista Carlos Marighella, morto em 1969 por ser um ativista contra a ditadura militar brasileira, compunham o cenário para o quarteto dar o seu recado, o qual foi muito bem aceito e entendido pelo público.

Canções compostas há mais de três décadas ainda ressoam em íntimo compasso com a nossa atual sociedade, e nesse balaio estavam Amazônia Nunca Mais, Crianças Sem Futuro, S.O.S. País Falido e o hino do punk nacional Crucificados Pelo Sistema.
Sem ter a obrigação de pedir a bênção ao pastor, padre ou político, João Gordo foi taxativo ao lançar luz na triste realidade do Brasil e do mundo, a qual é dominada por velhos fascistoides de pressão alta e disfunção erétil, e na normalização dos absurdos econômicos, sociais e políticos que assolam os quatro cantos do planeta.
Ele ainda debochou que todos ali estavam condenados pela igreja, pois eram criaturas de Satanás. Dessa forma, pediu ao público que fizessem “mão de fogo” para que a entrega as potestades do mal fosse de corpo e alma.
Caos, Não Me Importo, Beber Até Morrer, AIDS, Pop, Repressão e Crianças Sem Futuro causaram alvoroço na galera e foram a resposta terapêutica aos males citados anteriormente. Em uma hora de apresentação, os brasileiros provaram que o nosso punk segue sendo muito bem representado e com voz ativa para que os parasitas da sociedade não se acomodem no poder.

Promovendo a sua derradeira turnê, o The Exploited iniciou seu ataque punk em solo carioca com a sugestiva Let’s Start a War (Said Maggie One Day). Desde o início da apresentação, Wattie Buchan se mostrou abatido por conta dos recentes problemas de saúde, os quais o levaram à internação.
Mesmo assim, o frontman foi forçando o seu corpo ao limite, o que não foi uma boa ideia, visto que vomitou em pleno palco durante a execução da terceira canção, Dogs of War. Meio tonto e com respiração difícil, o escocês seguiu com a apresentação agitando e pedindo a participação da plateia, que retribuía todo o esforço do artista com rodas insanas, gritos e punhos cerrados no ar.
A despeito da boa resposta dos fãs ao show, a interação com Wattie não foi tão extensa, já que o seu estado de saúde era visivelmente debilitante. Em alguns momentos, a sua postura de palco era tão combalida que dava a ideia de um colapso em pleno palco, o que já aconteceu anos atrás.

E como era de se esperar, Beat The Bastards, Fuck The System, Punks Not Dead e USA – esta última com direito a uma bandeira da Palestina intacta no palco e uma flâmula dos Estados Unidos devidamente rasgada, aos trapos, e jogada ao chão – abalaram as estruturas do Circo Voador, que já pode pedir uma visita da Defesa Civil.
O ápice da noite foi o público invadindo o palco – a convite do baixista Irish Rob – enquanto rolava a performance de Sex & Violence. O quê de anarquia atingiu seu ponto mais caótico, o que só colaborou para o saldo positivo da noite.
Em sessenta minutos de festa, o The Exploited chancelou mais uma vez o seu lugar como um dos mais queridos e ativos nomes do punk rock. Wattie Buchan, que vomitou em diversos momentos do concerto, foi um gigante em cena, pois segurou a onda até o último acorde da noite.
Mas cá entre nós, o escocês precisa cuidar mais de sua saúde, porque, do jeito em que está, o rolê presencial com Joey Ramone, Sid Vicious e Joe Strummer não está longe de acontecer, não.

Via: RockBizz